O concurso de credores na recuperação judicial e o conceito de existência do crédito segundo o artigo 49 da LFRJ
- Criado em 08/10/2018 Por Bruno Manfro
Segundo o artigo 49 da LFRJ, estão sujeitos à recuperação judicial todos os creditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. A questão do concurso de credores parece clara e resolvida a partir desta regra geral. No entanto a questão não é tão intuitiva assim, por isso convido os colegas a dialogarem sobre o conceito de existência do crédito que passo a abordar.
A recuperação judicial é um instrumento jurídico posto à disposição dos empresários para superação de uma crise econômico-financeira. É regulamentada por uma legislação bastante extensa e complexa, que visa, como ideal, o estímulo à atividade econômica, a preservação da empresa e da sua função social.
Para manutenção dos interesses dos credores, há procedimentos específicos no curso da RJ de verificação e habilitação dos créditos, dispostos nos artigos 7º e seguintes da Lei 11.101/05. Neste sentido, o artigo 49 da referida lei preleciona que estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.
Entende-se, de modo geral, que todos os créditos constituídos anteriormente ao pedido de RJ se submetem ao plano de recuperação judicial, ou seja, no plano de pagamento dos credores, que consiste em uma novação de dívidas. Com efeito, os credores de dívidas anteriores à recuperação judicial precisam estar atentos para figurar no concurso de credores com o valor correto do seu crédito. Entretanto, o artigo 49 da LFRJ não é tão simples quanto parece e já foi objeto de muito estudo e discussão.
Isto porque o STJ e, por consequência, os tribunais estaduais, já adotaram compreensões antagônicas que foram construídas ao longo do tempo na sua jurisprudência. O posicionamento atual do tribunal superior, cujo paradigma é o REsp nº 1.634.046/RS e que influencia a jurisprudência majoritária, é no senso de que o crédito constituído em momento anterior à recuperação judicial, ainda que ilíquido e inexigível, se submete aos efeitos da RJ independente de sentença posterior que simplesmente o declare. A doutrina especializada traduz esse entendimento de forma bastante compreensível:
“Ademais, deve-se determinar qual a carga eficacial preponderante da sentença que reconhece a existência do dever, se declaratória ou constitutiva. As pretensões que, ao tempo do pedido de recuperação, ainda estão a depender de decisão cuja eficácia preponderante é declaratória ou condenatória já existem e, assim, sujeitam-se à recuperação. Entretanto, as pretensões que estão a depender de decisão cuja eficácia preponderante é a constitutiva podem ou não sujeitar-se à recuperação judicial, conforme seja essa eficácia ex tunc ou ex nunc. As sentenças constitutivas ora irradiam eficácia ex nunc, ora irradiam eficácia ex tunc. Nestas, em que a eficácia retroage ao tempo do fato, o crédito sujeita-se à recuperação judicial; naquelas, em que a eficácia irradia somente a partir da sentença, não.”#_ftn1" target="_blank">[1]
Por exemplo, submetem-se à recuperação judicial os créditos trabalhistas provenientes de trabalhos prestados antes do pedido, bem como as indenizações originadas de atos/fatos anteriores, mesmo que declarados em sentença posterior.
Por outro lado, os honorários advocatícios sucumbenciais, nesses casos, não se submetem à RJ. Portanto, cabe ao Juiz, com o apoio diligente do Administrador Judicial, verificar os créditos conforme o entendimento atual. Cabe, ainda, aos credores formularem os pedidos com base na jurisprudência e doutrina contemporâneas.
Bruno Menezes Manfro, OAB/RS nº 102.145, é sócio de Manfro & Andreatta Advogados, escritório de advocacia com sede em Osório/RS e que conta com uma equipe jurídica especializada em direito empresarial presente em cidades estratégicas do Rio Grande do Sul.
#_ftnref1" target="_blank">[1] AYOUB, Luiz Roberto; CAVALLI, Cássio. A construção jurisprudencial da recuperação judicial de empresas. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. P. 39.