REGISTRO DE MARCA: a possibilidade de coexistência.
- Criado em 09/01/2020 Por Vicente Aron Machado da Rocha
A Lei de Propriedade Intelectual, 9.279/1996, conferiu às marcas a proteção devida em face da concorrência desleal e de eventual pirataria em um mercado de livre-iniciativa, elevando a identificação original e única de um produto ou serviço a um patamar de proteção cuja presunção de propriedade e de exclusividade dos direitos econômicos permitem ao detentor desse registro utilizar-se de todos os meios jurídicos e administrativos para a sua proteção integral em todo o território nacional.
Assim, aquele que detém o registro de uma marca junto ao INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual) possui a garantia de que nenhuma outra pessoa de direito público ou privado, física ou jurídica, poderá utilizar da mesma marca sem que anteriormente haja a inequívoca permissão (licença) de utilização.
Segundo a Lei de Propriedade Intelectual, são suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais, estas contidas na própria legislação. Assim, não estão compreendidas na possibilidade de registro, por exemplo, letras, algarismos e números isoladamente; brasões, armas, medalhas, bandeiras, ou nomes próprios; indicações geográficas; cores; etc. Em outras palavras: todos aqueles sinais que, eventualmente, possam estar no senso-comum da população no que tange a serviços públicos ou que possam ser utilizados por mais de uma pessoa na exploração da atividade econômica, relacionando-se à atividade diretamente, além dos elementos que comporão o visual da marca (como as cores e as letras) não serão passíveis de registro junto ao INPI.
Curiosamente, entretanto, embora o artigo 124 da referida lei elenque 23 (im)possibilidades de registro, trataremos aqui especificamente do inciso XIX, que possui a seguinte redação:
Art. 124. Não são registráveis como marca:
XIX - reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia;
Em uma leitura breve, poderíamos considerar que toda e qualquer marca que possua reprodução ou imitação parcial de outra teria o pedido de registro indeferido. Embora, na prática, o INPI normalmente negue administrativamente os pedidos de registro de marcas semelhantes, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), mitigando os efeitos contidos nessa norma, possibilita o registro e a coexistência pacífica de duas marcas que possua grafismo ou vários elementos semelhantes, desde que preencha aos seguintes requisitos:
- Grau de distintividade intrínseca das marcas: embora possuam o mesmo "nome", a distintividade refere-se aos pontos em que a grafia em si possui de diferente uma em relação à outra.
- Grau de semelhança das marcas: refere-se às distinções visuais/gráficas gerais vistas nas marcas que pretendem coexistir; traduz-se como a primeira impressão do consumidor ao se deparar com a marca.
- Legitimidade e fama dos postulantes: o requerente posterior do pedido de registro da marca deve ter boa fama e não ter-se utilizado de subterfúgios ilegais no dia-a-dia da prática empresarial. Tal requisito é preenchido mediante declarações de clientes e mediante pesquisa em órgãos públicos;
- Tempo de convivência das marcas no mercado: as marcas podem ter coexistido durante longos períodos sem que houvesse qualquer confusão entre os consumidores.
- Espécie dos produtos em cotejo: necessariamente os produtos ou serviços comercializados pelas pessoas que possuem marcas similares deverão ser de atividades econômicas diferentes, sob pena de contrafação.
- Especialização do público-alvo: é consequência direta da espécie de produtos e de serviços; por exemplo: uma marca de materiais de construção, normalmente, possui um público alvo diferente de uma marca de produtos de higiene e beleza. Demais disso, enquadra-se nesse requisito a especialização diante da abrangência e da base territorial das marcas supostamente conflitantes.
Assim, embora seja a regra, a anterioridade de registro de determinada marca não necessariamente impedirá o registro posterior de outra, desde que verificado, no caso concreto, determinadas distinções que permitirão a coexistência pacífica das marcas sem qualquer concorrência desleal ou qualquer tipo de ofensa à boa-fé que se presume a partir do depósito da marca junto ao INPI.
Leia também: http://www.machadodarocha.adv.br/registro-de-marca-a-possibilidade-de-coexistencia/