A CLÁUSULA DE CONFIDENCIALIDADE: PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO IMATERIAL DA EMPRESA.
- Criado em 31/07/2018 Por Vicente Aron Machado da Rocha
Os contratos, de uma maneira simples, nada mais são que a expressão da livre autonomia das partes, em que dois ou mais sujeitos de direitos, em pleno uso de sua capacidade civil, resolvem obrigar-se por meio de um instrumento no qual constarão condutas positivas (fazer, entregar) ou condutas negativas (não fazer, não entregar).
Considerando-se, assim, que o ser humano utiliza a linguagem – verbal, escrita ou sinalizada – para exprimir a sua vontade, o meio de instrumentalizar essa pretensão em um instrumento próprio (contrato) dá-se por meio de cláusulas (ou estamentos), cujas naturezas são as mais diversas, dependendo da finalidade: declaratória, constitutiva, modificativa, suspensiva, compensatória, punitiva ou protetiva.
A propósito das cláusulas penais (punitivas), o Código Civil estabelece a dupla possibilidade de existência dessa cláusula, podendo ser de natureza ser moratória ou compensatória (art. 409)[1]. No caso da cláusula compensatória, a finalidade da sanção é a indenização pelos danos causados ao contratante que descumpre (completa ou parcialmente) a obrigação pactuada. Por outro lado, a cláusula moratória tem por objetivo a prevenção ao inadimplemento da prestação, funcionando como cláusula que reforça a obrigatoriedade da observância do contrato.
Por essa seara, relativamente a determinados contratos empresariais é essencial que as partes guardem segredo em relação ao objeto (intermediário ou final) da negociação, tendo em vista que certas informações, se divulgadas, poderão causar dano potencial à própria subsistência do negócio ou poderão ter efeitos nocivos sobre a concorrência, haja vista a dificuldade concreta de apuração de eventuais extensão dos danos[2]. Como exemplos de negócios que demandariam confidencialidade, pode-se citar: um desenho industrial específico, algum procedimento de verificação de qualidade interno, algum código específico que cria determinada ação dentro de um aplicativo para celular, etc.
Logo, a previsão de pacto de confidencialidade é prática altamente recomendável, sempre aliada à cominação expressa de multa para os casos de sua infringência. Importante ressaltar, ainda, que na convenção de cláusula penal pela inobservância da confidencialidade, a multa terá natureza compensatória e funcionará como liquidação antecipada do prejuízo genericamente estimado.[3]
A propósito, o valor da multa pode ser livremente pactuado entre as partes até o limite do valor total do contrato (artigo 412, Código Civil)[4], porquanto a isonomia dos contratantes permite o afastamento das legislações protetivas específicas, considerando todas as partes capazes não apenas de entender o impacto do montante de uma cláusula penal por descumprimento da confidencialidade, mas principalmente de entender a extensão da gravidade dessa violação.[5]
De qualquer maneira, não apenas os negócios que envolvam produtos podem ser protegidos por essa cláusula. Nos contratos que envolvam a prestação de um serviço específico como uma empreitada de uma obra, por exemplo, a cláusula de confidencialidade também pode ser inserida como meio de proteger o modus operandi do contratado. Igualmente se deve estabelecer uma multa em caso de inadimplemento.
Por fim, cumpre ressaltar que se recomenda a inclusão de cláusula de confidencialidade, pelo seu teor secreto, em instrumento anexo ao mandato, ao qual somente as partes contratantes terão acesso, garantindo, assim, que eventuais interesses de terceiros sobre as demais obrigações contratuais não acabem por desfazer com a confidencialidade. Ao cabo, portanto, a cláusula de confidencialidade visa tão-somente à proteção do patrimônio imaterial dos contratantes, afastando-se a possibilidade de pirataria sobre as suas capacidades criativas e colaborativas.
[1] Art. 409, Lei 10.406/2002: A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula especial ou simplesmente à mora.
[2] Especialmente diante de uma tecnologia da informação cada vez mais ágil e conectada, o dever de sigilo merece especial atenção nos contratos porque o vazamento de conhecimentos específicos é perigo real.
[3] Como já referido, a apuração de danos oriundos de vazamento de informações confidenciais pode ser impossível.
[4] Art. 412, Lei 10.406/2002: O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.
[5] Essa limitação da multa ao limite máximo do valor do contrato merece crítica e atenção, porque algumas vezes a inobservância da confidencialidade foi tão gravosa que os prejuízos verificados superam ao valor do contrato, tornando a multa manifestamente desproporcional aos resultados negativos produzidos.