Controladoria Jurídica e o Relacionamento com os Advogados do Contencioso
- Criado em 29/07/2019 Por Júlio César Ferroni Gomes
Nestas últimas semanas do ano de 2017 tive vontade de trocar ideias e experiências com outros profissionais, razão pela qual comecei a enviar mensagens às minhas conexões do LinkedIn a fim de que uma ou outra tenha alguns minutinhos para conversar sobre Controladoria Jurídica.
Entre as poucas respostas que recebi das conexões, pude absorver excelentes ensinamentos, bem como constatar que um dos assuntos mais recorrentes é a conflituosa relação entre os profissionais da Controladoria Jurídica e os Advogados do Contencioso em alguns escritórios. Isso, entretanto, não me surpreendeu em razão das experiências que já tive atuando tanto como Advogado como Controller.
Quando estava com a tarefa de estruturar um setor de controladoria jurídica passei por esse conflito.
Num primeiro momento, constatei que o problema se originava principalmente em razão de se estar criando um setor novo dentro do escritório, o que demandava a alteração de várias rotinas de trabalho, bem como a exigência de paciência com novas ideias, que não davam certo inicialmente e tinham que ser repensadas.
Além disso, através das conexões do LinkedIn, percebi, também, que os Advogados do Contencioso, em alguns escritórios, não gostam de ser “cobrados”. E eu coloco esse termo entre aspas porque talvez o profissional entenda estar sendo cobrado pela Controladoria, entretanto, esse não é o verdadeiro propósito deste setor.
A cobrança profissional deve existir a fim de melhorar a qualidade do serviço prestado pelo escritório, bem como a fim de auxiliar o desenvolvimento do próprio profissional, que às vezes não enxerga com clareza algumas situações em sua rotina de trabalho que podem ser melhoradas ou algum conhecimento que deve ser agregado. Essa cobrança não faz mal a ninguém, muito pelo contrário, somente beneficia se realizada adequadamente pelo líder do Contencioso ou da Controladoria, que está observando atentamente o trabalho. É preciso ter humildade para saber que a cada dia temos a oportunidade de aprender pelo menos uma coisa nova, que vai acrescentar à qualidade da atividade que desempenhamos junto aos demais colaboradores.
Mas, essa cobrança, como dito anteriormente, é realizada pelo líder do Contencioso ao Advogado deste setor, ou seja, pelo coordenador ao coordenado. A Controladoria, ao contrário disso, relaciona-se com os profissionais do Contencioso realizando seu propósito dentro do escritório de advocacia, que é facilitar o exercício da advocacia.
Ou seja, quanto mais a Controladoria vai ganhando corpo e assumindo atividades, que antes eram desorganizadamente distribuída entre os Advogados – por exemplo, diligências, cópias, carga de processos, retirada de documentos, protocolos – isso vai contribuindo a fim de que o profissional do direito tenha mais tempo para se dedicar a elaboração das suas teses e das peças, bem como organizar sua agenda levando em conta principalmente ou exclusivamente a agenda dos prazos processuais, que estão sob sua responsabilidade. Sobra mais tempo, ainda, para o advogado se dedicar a um atendimento com mais atenção ao cliente.
Por outro lado, o Advogado do Contencioso deve se preocupar principalmente com a data em que os prazos devem ser realizados ou com a data dos prazos fatais. O profissional do Direito deve ter em mente que o prazo é sagrado e deve ser muito bem administrado. O setor de Controladoria, neste ponto, auxilia ao Contencioso a verificar as datas fatais dos prazos, tendo em vista que, na qualidade de guardião do Sistema Jurídico, tem condições de elaborar relatórios detalhados sobre os prazos importantes e que ainda estão pendentes, bem como a data final para seu devido cumprimento. Dessa forma, a Controladoria vai desempenhar uma atividade complementar a do Advogado.
Como se pode notar, são dois controles do prazo sendo realizados – um geral pela Controladoria e outro pessoal pelo próprio Advogado – e isso, contudo, não retira a responsabilidade do Advogado ou significa que ele não tenha capacidade de monitorar satisfatoriamente seus prazos. Ao contrário disso, o controle de prazos realizado pela Controladoria é algo que pode auxiliar e complementar essa atividade referente ao monitoramento dos prazos individualmente.
Mas, o que realmente pode causar desgaste entre os profissionais dos dois setores (Contencioso e Controladoria) é a forma com que a o Controller vai indicar um prazo relevante, que está no último dia para o seu cumprimento, contudo, ainda não foi encaminhado para o protocolo pelo Advogado responsável.
Às vezes, o prazo não foi realizado porque está sendo aguardado algum documento ou por estratégia ou pelo excesso de trabalho do dia ou porque está sendo revisado pelo Coordenador, enfim, existe diversas situações que levam o prazo ser enviado ao protocolo nas últimas horas antes do seu termo final. É evidente que pode haver, também, falha do profissional no monitoramento de sua agenda, o que pode acontecer e é natural que aconteçam falhas nisso, pois, somos todos humanos. Agora, quando se tem o monitoramento também da Controladoria a chance de se perder o prazo legal para protocolo de uma petição se reduz drasticamente, tendo em vista que são dois controles independentes: um geral (Controladoria) e outro pessoal (Advogado do Contencioso).
Uma solução para se evitar conflitos é que o Controller, na qualidade de coordenador e líder do Setor de Controladoria, deve assinalar um prazo que está prestes a vencer ao Coordenador do Contencioso ao qual o Advogado responsável pelo cumprimento está vinculado. A partir daí, é que o Coordenador do Contencioso juntamente com os seus colaboradores é quem vai levantar todas as circunstâncias que estão envolvidas no atraso do protocolo. Ou seja, o Controller não é o profissional correto para "cobrar" a realização ou não de um prazo, cabe a ele monitorar os prazos que devem ir a protocolo no dia e indicar os que estão atrasados à pessoa correta (Coordenador do Contencioso) e somente isso.
Por essa razão que a “indicação” de prazos atrasados deve ser feita entre os líderes da ambos os setores (Controladoria e Contencioso), que devem estar devidamente alinhados entre eles a fim de que isso não se traduza numa indicação de erros, mas, de um cuidado para com a qualidade do serviço prestado aos clientes.
Neste ponto é que entra a gestão e estratégia dos sócios do escritório, que devem deixar isso muito bem ajustado entre seus líderes de Controladoria e de Contencioso. A responsabilidade pelo cumprimento do prazo é do Advogado que cuida pessoalmente do processo, agora esse trabalho realizado pela Controladoria, comunicando-se com o setor de Contencioso é colaborativo e complementar, de forma alguma se traduzindo como cobrança, mas como verificação e indicação.
Pode-se dizer que o Controller realiza uma atividade estratégica dentro do escritório de advocacia enquanto que o Advogado desempenha a atividade fim. A Controladoria auxilia o Contencioso a realizar essa atividade fim da forma mais adequada e sem prejuízos ao cliente e ao próprio escritório.
Errar é humano e o monitoramento de prazos é realizado por seres humanos. Então, se num infeliz dia o Advogado erra o Controller está ali para colaborar e não deixar que esse erro comprometa a atividade fim e vice-versa. O trabalho tem que ser conjunto, em equipe, todos querem a mesma coisa, ou seja, prestar um excelente serviço de advocacia e todos vão ganhar com isso.
Controladoria e Contencioso são apenas dois setores que pertencem a uma equipe maior formada por todos os colaboradores do escritório de advocacia e assim devem se comportar no dia a dia, onde cada um desempenha suas atividades conforme o propósito que é vislumbrado pelos sócios gestores.
Sejamos profissionais. Quem deve assinalar uma situação que a assinale com profissionalismo, de maneira digna e humana, ao mesmo tempo em que quem deve realmente realizar a cobrança assim a faça da mesma forma. Somente dessa forma, creio eu, temos a oportunidade de realizar um trabalho sem desentendimentos, mantendo o ambiente mais saudável possível.
Para finalizar, é evidente que não é apenas na atividade de elaboração dos prazos que podem ser geradas situações de conflito entre os profissionais do Contencioso e da Controladoria, de qualquer forma, o respeito às atividades específicas, os propósitos bem definidos e o respeito entre os profissionais são coisas que certamente pacificam qualquer ambiente conturbado e dificuldades de relacionamentos.