O avanço das mulheres nas eleições - No entanto, ainda há muito mais espaço para as mulheres na política
- Criado em 15/10/2018 Por LinkLei
Em 2018 muito se debateu sobre a presença da mulher na política brasileira. Ocorreram dois expressivos julgamentos relativos ao financiamento de campanha de candidaturas femininas, no STF a ADI 5.617 e no TSE a Consulta n. 0600252-18.2018.6.00.0000. O Supremo, em março, estabeleceu que a distribuição dos recursos do Fundo Partidário deve observar o patamar mínimo de 30% (trinta por cento) de candidaturas femininas, por equiparação com o que está previsto no art. 10, § 3° da Lei n. 9.504/97. Já o Eleitoral, em agosto, estipulou que estes 30% fossem fixados para o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e para o tempo de propaganda gratuita de rádio e televisão.
O resultado deste posicionamento do Judiciário foi visto pela população brasileira nas últimas horas de domingo, dia 7 de outubro. A bancada feminina na Câmara Federal subiu de 51 para 77. Trata-se do maior número de deputadas federais eleitas em um pleito brasileiro. Um aumento de 51% comparado com a legislatura atual, maior aumento já registrado de parlamentares mulheres em uma eleição. Por outro lado, no Senado o número permaneceu o mesmo, 7 senadoras. Diante disso, a bancada feminina no legislativo federal, que atualmente é inferior a 10%, subirá em 2018 para quase 15%.
Merece destaque Roraima, que elegeu a primeira deputada federal indígena do país, Joana Wapichana (REDE). Em 190 anos de existência da casa é a primeira vez que uma mulher indígena consegue uma vaga. Advogada de 43 anos, Joana detém outros feitos inéditos: foi a primeira mulher indígena a se formar em Direito no Brasil, em 1997, pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), e a primeira advogada indígena da história brasileira a se pronunciar no plenário do Supremo Tribunal Federal. Joana é mestre em Direito pela Universidade do Arizona.
Apesar de Maranhão, Sergipe e Amazonas não terem elegido nenhuma mulher, o Distrito Federal elegeu 5 em uma bancada composta por 8 parlamentares, tornando-se a Unidade Federativa com maior proporção de mulheres eleitas em sua bancada (62,5%).
Em termos absolutos, o estado com maior número de deputadas é São Paulo, com 11 mulheres na bancada de 70. Dentre as quais Joice Hasselman (PSL), a deputada federal mais votada do Brasil neste pleito com mais de 1 milhão de votos (em termos gerais ficou atrás apenas de Eduardo Bolsonaro, que teve mais de 1,8 milhões). Outro destaque vai para Tabata Amaral (PSOL), 6ª deputada federal mais votada. Tabata nasceu em Vila Missionária, bairro pobre da zona sul de São Paulo, e formou-se em astrofísica e ciências políticas pela Universidade de Harvard.
Considerando as Assembleias Estaduais, foram eleitas 161 deputadas, o que representa 15% dos parlamentares estaduais/distritais – um aumento de 35% em relação a 2014. Um dos destaques é Janaína Paschoal (PSL), que obteve mais de 2 milhões de votos, se tornando a recordista de votos em termos absolutos para deputada (seja federal ou estadual). Janaína é advogada e professora da Universidade de São Paulo, onde também obteve o título de doutora. Foi uma das autoras do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, junto com Miguel Reale Júnior e Hélio Bicudo, além de ter participado ativamente na tramitação do processo no Congresso Nacional.
Mais uma vitória que merece destaque no legislativo de São Paulo é de Erica Malunguinho da Silva (PSOL), primeira deputada transgênera a compor a Assembleia Legislativa Paulista. Mulher, trans, negra, natural de Pernambuco, Erica é mestra em Estética e História da Arte pela USP e criadora da Aparelha Luzia, um quilombo urbano, espaço para fomentar produções artísticas e intelectuais na capital paulista.
E Marielle virou semente. Três ex-assessoras de Marielle Franco foram eleitas para a Assembleia do Rio de Janeiro, Renata Souza (PSOL), Mônica Francisco (PSOL) e Dani Monteiro (PSOL). Talíria Petrona, amiga de Marielle, foi eleita a 9ª parlamentar mais votada do Rio de Janeiro para a Câmara dos Deputados.
Ainda há muito mais espaço para as mulheres na política, sendo fundamental a presença mais proporcional de todos os segmentos da sociedade no Legislativo, Executivo e Judiciário. Seja para ampliar e amadurecer a nossa democracia, seja para evitar distorções no processo político, há que se continuar trabalhando.
Apesar dos números serem extremamente positivos em relação ao aumento da participação da mulher na política, ainda assim o Brasil fica abaixo da média mundial, que chega a ser de 22,1%. Os números brasileiros permanecem inferiores aos do Oriente Médio, com uma taxa média de participação feminina de 16%. Na Arábia Saudita – que apenas há pouco tempo permitiu às mulheres obterem licença para dirigir – a representação feminina é de 19%.
A legislatura de 2014 colocava o Brasil na 115ª posição, dentre 138 países classificados no ranking de representação feminina no legislativo. Em pesquisa realizada pela Secretaria de Políticas para Mulheres (SPM), constatou-se que, apesar de a candidatura feminina ter crescido 84,5% entre 2008 e 2012 em Câmaras Municipais, em 2008 apenas 8,9% das candidatas se elegeram e em 2012 este percentual caiu para 5,7%. Conforme a organização não governamental PMI, a participação feminina na política brasileira tem um expansão média de 2,7% ao ano, como verificada entre 1998 e 2016.
Diversos fatores influenciam a baixa representatividade política das mulheres, todavia, o falta de recurso em campanhas eleitorais é, sem sombra de dúvida, um dos pontos de maior relevância. Dados apontam que candidatas receberam cerca de um terço da média de arrecadação de candidatos nas eleições de 2014. Na corrida pela Câmara dos Deputados, os 4.143 candidatos homens arrecadaram, em média, R$ 252.266,74, enquanto as 1.723 candidatas mulheres angariaram, em média, R$ 65.461,29. Considerando apenas o financiamento dos eleitos, a diferença diminui: os 462 homens eleitos arrecadaram, em média, R$ 1.453.683,14; as 51 mulheres eleitas R$ 1.292.748,68.
Ainda não foram feitos levantamentos com os gastos das campanhas de 2018. Todavia, pode se afirmar que, apesar de ainda ser tímido o avanço das mulheres na política, certamente a eleição de 2018 será lembrada, dentro tantas outras coisas, pelas vozes, votos e candidaturas femininas.
Por: Cristina Maria Gama Nevez da Silva
Fonte: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/o-avanco-das-mulheres-nas-eleicoes-11102018