Bate-papo com um jovem advogado tributarista
- Criado em 19/07/2019 Por LinkLei
Escritório de advocacia ou Big Four? A boa notícia é que a qualquer momento é possível migrar de um para outro
Sou Luciana, bacharel em Ciências Econômicas e Contábeis e advogada. Dos 25 anos de minha vida profissional, passei 18 anos em uma firma de auditoria independente sendo auditora especialista na área de tributos e consultora tributária. Há seis anos resolvi experimentar a vida de advogada e passei a atuar em escritório de médio porte e com forte atuação em várias áreas do Direito Empresarial.
Dado o meu histórico profissional e, pelo fato de também ser professora em curso de especialização, é comum que jovens advogados me abordem questionando as principais diferenças entre trabalhar em firma de auditoria independente, as conhecidas “Big Four”, e em escritório. E é isso que pretendo, em breves linhas, responder aqui.
Obviamente as estruturas dessas firmas, todas internacionais, são muito maiores do que as dos escritórios de advocacia brasileiros, até porque a legislação aplicável à advocacia no Brasil ainda impõe uma série de limitações ao financiamento e, por conseguinte, ao seu crescimento.
As “Big Four” (incluindo aí as empresas de consultoria) são multidisciplinares, com contadores, advogados, engenheiros, economistas, atuários, matemáticos e a cultura contribui para que o conhecimento seja compartilhado. Já os escritórios são sociedades uniprofissionais, portanto, basicamente seus profissionais são todos (ou na grande maioria) advogados. Ainda assim, há troca de conhecimento e experiência, principalmente em escritórios que contemplem áreas complementares, como societário, mercado de capitais, tributário, contratos, entre outras.
Quanto ao dia a dia dos trabalhos, também há uma diferença bastante relevante, com prós e contras em ambos os ambientes. Como as estruturas dos escritórios são menores, estagiários e advogados acabam tendo mais oportunidades de trabalharem diretamente com os profissionais mais experientes (ex. sócio) e, assim, a depender de sua perspicácia e capacidade de observação, o processo de aprendizagem pode ser acelerado. Por outro lado, nas “Big Four” o processo é bem estruturado e sem queima de etapas. Aprende-se a trabalhar em equipe, a fazer de tudo um pouco, advogados descobrem que podem e devem fazer contas e que o excel passará a ser um “amigo” constante. Nas firmas de advocacia o trabalho acontece essencialmente no escritório, em fóruns ou em órgãos de julgamento. A interação com os clientes se dá pontualmente em reuniões, e-mails ou telefonemas. Já nas “Big Four” a ordem é estar no cliente, o que permite conhecer diferentes ambientes corporativos e ampliar expressivamente o networking,
Para o jovem tributarista, a vantagem de trabalhar na “Big Four” é ter intenso treinamento formal, pensar o tributo considerando a necessária interação que existe entre Direito Tributário e Ciências Contábeis, já que a prática exige analisar informações contábeis, além de poder adquirir uma valiosa experiência relacionada às obrigações acessórias no âmbito do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), muito mais útil do que pode parecer! Por outro lado, a vantagem do profissional de escritório é ter contato com o negócio mais tradicional da advocacia: o contencioso administrativo ou judicial.
Quanto à consultoria tributária, pode parecer que a feita em uma “Big Four” é similar à feita em uma firma de advogados, mas para quem já esteve dos dois lados, é possível perceber que os clientes têm expectativas diferentes. Enquanto a consultoria da “Big Four” é empresarial, normalmente dirigida ao pessoal de finanças, a consultoria feita em firma de advogados tende a ser mais densa juridicamente.
É bem verdade que nos dois casos a linguagem precisa ser técnica, porém acessível a quem lê, que os clientes desejam soluções tão completas quanto possível e que não se limitem pelas fronteiras das disciplinas ou de normas profissionais. Em um escritório de advocacia é possível oferecer ao contratante soluções jurídicas mais abrangentes, por exemplo, propondo medidas judiciais que contribuam para a segurança na adoção de certas estratégias. Já nas “Big Four”, a vantagem está em ser possível encontrar num só lugar profissionais com expertises distintas e que juntos possam resolver determinado problema. É o caso de trabalhos que exigem conhecimento jurídico e em tecnologia, com capacidade de reprocessamento de informações e inteligência analítica de dados.
Seja nos escritórios, seja nas “Big Four”, os trabalhos podem ser muito criativos e devem ser sempre muito rigorosos com a qualidade e com a confidencialidade das informações. As duas experiências são extremamente válidas para quem deseja atuar na área tributária.
A boa notícia é que a qualquer momento, migrar da “Big Four” para um escritório ou vice-versa será sempre possível e, num mundo profissional tão dinâmico quanto o atual, ter experiências que se complementam pode ser interessante.
Por fim e, mais importante, é estar sempre atento para as características pessoais de cada profissional e a compatibilidade dessas características com a cultura corporativa e as demandas técnicas mais exigidas em cada lugar!
Luciana Ibiapina Lira Aguiar – Luciana Ibiapina Lira Aguiar, sócia de Bocater Advogados, é mestre em Direito Tributário pela FGV-SP, bacharel em Ciências Econômicas e Ciências Contábeis, professora nos cursos de pós-graduação da Faculdade de Direito da FGV e professora conferencista no IBET