A evolução do conceito de contrato como título executivo na pós-modernidade
- Criado em 10/12/2018 Por LinkLei
Quantas vezes algum cliente te indagou com a seguinte pergunta: “Dr(a), eu fechei um contrato, prestei o serviço e pessoa/empresa não me pagou. Não cheguei a ter o documento físico assinado, apenas enviei por email o contrato e a pessoa me deu “ok”. Como posso cobrar o valor?”
Ou ainda: “fechei um negócio exclusivamente pelo whatsapp, ou por messenger do Facebook, ou direct do Instagram, isso tem validade Dr(a)? Quais são os meus direitos?”
É certo que a era da pós-modernidade é marcada pelas relações virtuais e avanços tecnológicos, cada vez mais presentes e constantes, tanto na rotina empresarial, pessoal e governamental, o que implica diretamente na dinâmica e velocidade dessas relações.
Isto posto, será que o conceito de contrato atualmente descrito em nossa Doutrina e normatizado pelo Código Civil, principalmente no que tange ao formalismo de algumas espécie e tipos de contrato, ainda atende às relações jurídicas atuais?
Será que não é hora de adaptar os pilares do Direito Contratual considerando esta nova realidade social?
É claro que os principais fundamentos e princípios do contrato devem permanecer inalterados, como agentes capazes, autonomia da vontade, pacta sunt servanda, boa-fé e equilíbrio contratual, bem como função social do contrato.
Neste sentido, Patrícia Peck destaca:
“Por isso, o tema aqui em discussão é atual e de suma importância, bem como merece ser mais bem estudado, pois, afinal, os contratos digitais, ou também chamados eletrônicos , representam apenas a mudança do meio, que deixa de ser físico ou em papel, ou se de fato são uma nova modalidade dentro dos contratos atípicos. Ou, ainda, será que são uma outra coisa, um novo instituto, alguém que vá além do próprio conceito de contrato?”
Ora, sabemos que na ausência de formalização de um instrumento jurídico, o Código Civil será aplicado; porém a relevância da discussão se insere quando este contrato, essencialmente digital ou eletrônico, passa a ter eficácia de título executivo.
Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça entendeu como título executivo um contrato de mútuo firmado digitalmente e sem a presença e assinatura de testemunhas, a despeito do formalismo contratual, REsp 1495920, merecendo destaque trecho do relator:
“A assinatura digital do contrato eletrônico, funcionalidade que, não se deslembre, é amplamente adotada em sede de processo eletrônico, faz evidenciada a autenticidade do signo pessoal daquele que a apôs e, inclusive, a confiabilidade de que o instrumento eletrônico assinado contém os dados existentes no momento da assinatura”.
Este precedente traz extrema relevância para o Direito atual, na medida em que garantirá aos jurisdicionados uma maior celeridade no recebimento de seu crédito, uma vez que poderá executar o valor mediante Ação de Execução, e não por Ação Monitória ou Cobrança Judicial.
Caminhando mais além: se cabe interpretação no sentido de que um contrato com assinatura digital dispensa assinatura de testemunhas – por conta do aceite das condições ali elencadas – o devedor, fazendo uso do certificado digital com login e senha privativos, confirma a validade do negócio firmado.
O mesmo raciocínio não se aplicaria aos documentos físicos, já inseridos e previstos no conceito atual de contrato?
Ora, o julgado aplicou inegavelmente os costumes e práticas atuais de mercado ao revestir de qualidade exequível o documento, mas sempre alicerceados nos princípios do Direito Contratual.
Seria correto afirmar, então, que os contratos digitais estão forçando o surgimento de uma modificação no conceito de contrato, porém não se limitando às avenças digitais e eletrônicas, mas sim à todos os contratos, espécies e tipos, lato sensu, principalmente se incluirmos neste rol outras novas tecnologias, como os Smart Contracts e IoT.
Como operadores do Direito, em busca de atrair soluções práticas através da inovação e tecnologia jurídicas, estamos assistindo aos Tribunais Brasileiros, não alheios à nova realidade social, aplicar a norma a partir da interpretação dos princípios do Direito Contratual, aliado aos costumes e práticas atuais de mercado, para assim adaptar e adequar o Direito à sociedade de hoje.
Por: Julia Dutra e Gabriela Barreto
Fonte: https://www.lexmachinae.com/2018/12/06/contrato-titulo-executivo-pos-modernidade/